Histórico das APIs no monitoramento e pesquisa em mídias sociais

Quando eu comecei a trabalhar com monitoramento, em dezembro de 2015, o Facebook já tinha matado de vez a possibilidade de coleta de posts públicos no feed da plataforma. Ou seja, quando eu entrei no mercado, o caos que agitou empresas e agências já tinha sido razoavelmente controlado para o ano seguinte, com algumas alternativas surgindo para suprir essa valiosa lacuna – como escrevi nesse outro post, a exemplo da popularização das disciplinas de Etnografia e Análise de Redes, além do redirecionamento para CRM. Desde então, fora algumas perdas pontuais, não tivemos muitas mudanças no cenário – até que 2018 aconteceu.

Do ano passado para cá, as perdas pontuais que levaram anos para acontecer acabaram se tornando praticamente mensais. Isso aconteceu principalmente porque, no olho do furacão da opinião pública, Mark Zuckerberg se viu obrigado a tomar responsabilidade pelo seu monopólio técnico-comunicacional (Facebook, Instagram, WhatsApp e Messenger) quanto à privacidade dos dados de seus usuários. Em paralelo (e também em consequência), surgiram iniciativas governamentais como a General Data Protection Regulation na União Europeia para fortalecer uma conscientização e responsabilização por parte de toda a sociedade civil quanto ao uso de dados de cidadãos para fins diversos.

Embora os argumentos de Zuckerberg sejam facilmente contestáveis (como fizeram Richard Rogers e Tommaso Veturini em artigo recente), enquanto usuários/indivíduos/cidadãos, poderíamos admitir que essa preocupação com a privacidade dos nossos dados é algo positivo para a sociedade de modo geral (novamente, sob uma perspectiva bem ingênua que supõe que nossas informações ficarão guardadinhas no Facebook e demais empresas digitais e não serão utilizadas por quem pagar mais). No entanto, para quem trabalha com dados de mídias sociais (com fins mercadológicos ou acadêmicos), o futuro é muito preocupante.

Antes de entrar nessa indispensável discussão sobre o futuro (embora já tenha trazido aqui no blog outros textos que abordam essa questão — e tenho alguns outros planejados), acho importante olharmos também para o passado. É nesse contexto, portanto, que lançamos hoje no IBPAD a publicação “Histórico das APIs no monitoramento e pesquisa em mídias sociais”. Sob a minha autoria, o material faz um remonte histórico a partir de notícias e reportagens de como as APIs foram lançadas, popularizadas e modificadas no contexto da pesquisa e do monitoramento. Para fins didáticos, elenquei cinco períodos sobre essa história:

  • 2006 – 2010: O nascimento otimista das APIs
  • 2010 – 2013: Os primeiros problemas
  • 2014 – 2015: As primeiras mudanças
  • 2016 – 2017: O início do fim?
  • 2018 – 2019: O futuro desafiador

É evidente que esses períodos foram arbitrariamente recortados conforme julguei coerente, no entanto, partiu de um esforço de compreensão geral do mercado e do contexto digital como um todo. No primeiro momento (2006-2010), portanto, discorro sobre como surgiram as APIs e como – por muitos anos – havia um certo otimismo em relação a elas; em seguida (2010-2013), matérias começavam a questionar – e denunciar – o montante de dados disponíveis nas mídias sociais; o que resultou nas primeiras mudanças (2014-2015), como o fim da v1.0 da Graph API do Facebook; e as coisas foram piorando (2016-2017), até chegar onde estamos atualmente (2018-2019).

Ainda que tenha abordado as APIs do Twitter, YouTube e Instagram na publicação, o foco principal é o Facebook – por vários motivos: 1) pela importância da plataforma na vida dos brasileiros; 2) pela importância da plataforma no mercado de monitoramento de mídias sociais; 3) por ter sido a plataforma que mais registrou mudanças nos últimos anos; 4) por ter uma figura pública à frente como porta-voz e, portanto, maior cobertura midiática; 5) por deter o monopólio sobre as principais mídias sociais, tendo comprando o Instagram, o WhatsApp e tornando o Messenger em um produto independente; etc.

Linha do tempo ordena os acontecimentos mais relevantes para o mercado de monitoramento e pesquisa em mídias sociais / Fonte: IBPAD

É importante ressaltar também que a “história” é contada sobretudo pela perspectiva do mercado de monitoramento. Ou seja, ainda que tenha tentado expandir um pouco o debate e citado até alguns textos acadêmicos/teóricos sobre a temática, o objetivo era narrar como as APIs sofreram alterações drásticas nos últimos anos e por que isso era relevante ou como isso afetava as ferramentas, agências digitais e marcas envolvidas com esse trabalho. Além do levantamento de notícias, matérias e reportagens, também fiz minimamente um trabalho interno em grupos de discussão do mercado para saber como os profissionais reagiam aos acontecimentos.

Foi um trabalho bem legal e que humildemente me orgulho bastante de ter feito. Aprendi muito sobre o mercado e descobri várias coisas da época em que eu ainda não estava presente – como o caso da DataSift com o Facebook Topic Data, que eu nunca tinha entendido direito; ou do firehose do Twitter com a GNIP, que também só tinha ouvido falar. Espero que o material possa apresentar um pouco da breve história do monitoramento sob a perspectiva das APIs àqueles que chegaram depois (como eu) e que possa também jogar uma luz nesse debate que é indispensável tanto para o mercado quanto para a academia.

A última parte da publicação, inclusive, que intitulei “O que o futuro guarda?”, é propositalmente inconclusiva. Tanto porque eu obviamente não tenho a resposta para essa pergunta quanto porque acho importante não tentar fechar o sentido do debate, pois não há verdades absolutas – nem soluções milagrosas. Nos próximos posts aqui do blog, trarei mais uma vez a questão das APIs à tona a partir de uma visão crítica sobre seus aspectos sociotécnicos – principalmente a partir do fantástico trabalho da pesquisadora Janna Omena – e pretendo colocar em pauta o seguinte questionamento: o monitoramento vai morrer?

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